À medida que avançamos em direção a um futuro mais sustentável, a transição energética tem ganhado força, impulsionada pela necessidade de reduzir a pegada de carbono e mitigar os impactos das mudanças climáticas. Nesse cenário, os carros elétricos emergiram como uma opção promissora, sendo amplamente vistos como o caminho a seguir para a indústria automotiva.
Combustível do futuro: Metas e prazos para encerrar a produção de veículos a combustão
Até o final de 2023, pelo menos duas dezenas de fabricantes estabeleceram prazos limite para encerrar a produção de veículos a combustão. A maioria dessas empresas definiu 2030 como a meta para lançar apenas modelos elétricos com baterias (BEV). No entanto, essa estratégia tem sido revisada nos últimos tempos.
Embora o interesse por veículos elétricos permaneça forte, há evidências concretas de que a próxima década pode não ser tão “eletrizante” quanto se esperava, tanto no Brasil quanto no mundo. Por exemplo, o Reino Unido já ampliou seu objetivo de proibir a venda de carros novos movidos a combustão para 2035.. Nos Estados Unidos, o objetivo do governo é atingir uma participação de cerca de 67% de carros elétricos até 2032.
Combustível do futuro: Motores a combustão e combustíveis sintéticos neutros em carbono
Nesse contexto, algumas marcas começaram a trabalhar para demonstrar que os carros a combustão podem ser compatíveis com a sustentabilidade e a redução da pegada de carbono. Toyota, Subaru e Mazda anunciaram uma aliança para desenvolver novos motores a gasolina..
O objetivo dessas empresas é tornar essas novas unidades compatíveis com combustíveis sintéticos neutros em carbono, como o hidrogênio. No entanto, durante um período de transição, esses propulsores também funcionarão com outros combustíveis fósseis, como gasolina e diesel.
O que são combustíveis sintéticos?
Os combustíveis sintéticos emergem como alternativas viáveis aos combustíveis fósseis tradicionais e estão se tornando cada vez mais proeminentes no debate sobre a transição energética. Eles são produzidos a partir de dióxido de carbono (CO2) e hidrogênio, por meio de processos químicos avançados.
Exemplo prático: o eFuel da Porsche
A Porsche já está produzindo no Chile um combustível sintético chamado eFuel, obtido a partir do hidrogênio (proveniente da quebra das moléculas da água) e do CO2 presente na atmosfera. O resultado é o e-metanol, que passa por diversos processos para dar origem ao eFuel.
Segundo a Porsche, o eFuel é tão eficiente em termos de consumo e desempenho quanto a gasolina convencional, permitindo uma operação quase neutra em CO2 dos motores a combustão. Além disso, essa tecnologia pode resultar em querosene e diesel limpos para serem usados em aviões e barcos.
Desafios e custos dos combustíveis sintéticos
Um dos principais obstáculos para a adoção em larga escala dos combustíveis sintéticos é o custo elevado de transformação do CO2 e hidrogênio em combustível, cerca de quatro vezes maior que o custo dos combustíveis fósseis. Atualmente, o preço seria inviável para o consumidor. No entanto, espera-se que os custos diminuam à medida que a tecnologia evolua e novos processos sejam desenvolvidos.
A Porsche tem como objetivo suprir os 1,3 bilhão de carros a combustão que ainda estarão rodando ao redor do mundo nas próximas décadas, mesmo com o advento da eletrificação. Para isso, há estudos em andamento para implementar outras fábricas de combustível sintético em países como Estados Unidos e Austrália, além do Brasil, que possui um grande potencial de fontes renováveis, como eólica e solar.
Biocombustíveis: etanol, biodiesel e biometano
Diferentemente dos combustíveis sintéticos, que são produzidos a partir de processos químicos, os biocombustíveis são criados a partir de recursos renováveis, como a biomassa. Exemplos incluem etanol, biodiesel e biometano.
O ponto importante do etanol
O etanol é um ponto importante nessa discussão. Além de ser usado como uma matriz energética mais limpa do que os combustíveis fósseis, como a gasolina e o diesel, o etanol pode ser utilizado para produzir hidrogênio. Por sua vez, o hidrogênio pode ser empregado tanto para gerar eletricidade para motores elétricos em células de combustível quanto como combustível gasoso.
Uma das principais vantagens do hidrogênio é sua quase nula emissão de CO2.. Segundo Anderson Suzuki, responsável pelo Departamento de Desenvolvimento de Negócios de Hidrogênio da Hyundai, existem muitos pontos positivos para a utilização desse composto.
Veículos equipados com a células de combustível de hidrogênio
Os veículos equipados com a célula de combustível a hidrogênio funcionam combinando as células de hidrogênio (H2) e oxigênio (O) em um catalisador, gerando eletricidade por meio de uma reação química. No final do processo, o sistema emite apenas água destilada (H2O), purificando o ar coletado inicialmente.
Comparados aos veículos elétricos a bateria, os carros a hidrogênio destacam-se pela vantagem do abastecimento rápido. Em vez de horas conectados a um carregador, bastam cinco minutos para encher o tanque com hidrogênio.
Desafios dos veículos a hidrogênio
Apesar de promissores, os carros movidos a hidrogênio ainda enfrentam diversos desafios.. A célula de combustível é cara, e o custo do hidrogênio na Coreia do Sul, atualmente, é equivalente ao da gasolina. No entanto, espera-se que os preços diminuam nos próximos anos.
Além disso, existem complicações logísticas relacionadas ao armazenamento e transporte do hidrogênio, que é um composto altamente inflamável. A infraestrutura de abastecimento é um investimento caro, e sem ela, não seria possível operar esses veículos em larga escala.
No Brasil, há uma “vocação” para o uso de biomassa via etanol, que resulta em hidrogênio com baixíssimo nível de carbono. A expectativa é alcançar um preço competitivo na América Latina em um prazo de seis anos.
Alternativas ao diesel: biodiesel e HVO
No setor de transporte de cargas, há alternativas ao diesel convencional, tais como o biodiesel e o HVO (diesel verde)..
Biodiesel e transesterificação
O biodiesel é produzido por um processo químico chamado transesterificação, que utiliza álcool como reagente. Embora seja um progresso em relação ao diesel fóssil, o biodiesel ainda emite gases poluentes.
O Brasil é reconhecido como o terceiro maior produtor de biodiesel no mundo, superado apenas pelos Estados Unidos e pela Indonésia. No país, a mistura de biodiesel ao diesel está atualmente fixada em 10%, com planos de aumentar para 15% até 2026, subiu de 12% para 14% desde abril de 2024.
HVO: o diesel verde
O óleo vegetal hidrotratado (HVO) apresenta-se como uma alternativa promissora ao biodiesel. Ele pode ser produzido a partir de óleos vegetais, gorduras residuais (como óleo de cozinha) ou gorduras animais, matérias-primas abundantes no Brasil.
Diferentemente do biodiesel, o HVO é obtido por um processo de hidrotratamento, o que resulta em um combustível com menor emissão de poluentes. Projetos já estão em andamento no Senado para estabelecer programas nacionais voltados ao desenvolvimento de diesel verde, biogás, biometano e combustíveis sustentáveis para aviação.
Quanto à gasolina convencional que conhecemos hoje, a previsão é de que ela terá um fim, embora não seja possível determinar exatamente quando isso ocorrerá. Marcas e governos estão caminhando para a utilização de biocombustíveis e combustíveis sintéticos como alternativas mais sustentáveis.
À medida que avançamos rumo a um futuro mais sustentável, é evidente que a transição energética trará mudanças significativas para a indústria automotiva. Embora os veículos elétricos sejam frequentemente considerados a solução principal, os combustíveis sintéticos, o hidrogênio e os biocombustíveis, como o etanol, também terão um papel significativo na redução das emissões de carbono e na construção de uma frota veicular mais limpa.
Independentemente do caminho escolhido, é fundamental que a indústria automotiva, os governos e a sociedade em geral trabalhem em conjunto para impulsionar a transição energética e garantir um futuro mais sustentável para as gerações presentes e futuras.